sábado, 24 de março de 2012

Moça

Naquilo que era para voar,
Ficou quieta
Buscou em frente
Caminhou
Muitos passaram
Sorveu um gole de chá – de canudinho
Cogitou um beijo na boca
A tarde esquentava em direção a noite
Quis um abraço
Imaginou de que braços
Só barulho de carros ouvia
Fumaça
Um poste acendeu,
Dois, três, quatro,
A cidade toda
Enquanto esperava o amor

segunda-feira, 19 de março de 2012

Fragmento de Auto-Retrato.

Tem algo em mim que é sempre longe
Sempre alheio
Inapreensível

Tem algo de mim que é sempre adeus
Sempre torcido
De lado

Tem algo
Sem limites
Que não senta
Algo
De rio
Água de floresta às cinco horas

Tem algo em mim
Que não precisa
Nem depende ou espera
Permite a leva
Sem laços
Descondicionado

Permanência desatada
Apenas voluntária - a insegurança dos "amigos"

Errância natural
meu traço vital

sexta-feira, 16 de março de 2012

Sem título

Como afeta.
Tudo se junta numa trama de nexos e sentimentos os quais meu espírito tem de conter. A compreensão é difícil, talvez impossível para minha pele e meus nervos. – A gente quer alguma compensação, alguma justiça justa, mas é provável que o mundo não seja interligado como minha mente procura simular. Pode ser que não exista sentido fora de mim.

Ah, este descompasso, estes pedaços desencontrados...
Meu corpo tenta modelar uma razão mínima para esta angústia. Só estou em palavras (o que tenho). Palavras que conversam comigo. Minha família feita significados grafados em luz, elétrons flutuantes.
Eu e minhas pequenas letras: ambiente de quem não tem nenhum amor. Floresta silenciosa de escuta e compreensão. Sempre caminho do sertão.
Minhas pequenas asas, transparências no vento: as letrinhas que são meu firmamento.

Quão macia é a vida para quem cultiva cotidiano – para quem busca cotidiano: as carícias todas, o polvo doce dos enlaces sentimentais, o intercâmbio de fluídos.
De leve, só posso as palavras. Volto para a vida e ela rasga.

Vocês não sabem como mata ser forte: o abandono das necessidades mais íntimas, o choro engolido – ou o choro sem companhia –, a entrega à respiração; a resistência por um princípio de coletividade. Caminhar, vagar, espraiar-se até desaparecer; manter-se vivo por respeito a vida e nada mais. Esquecer as faltas todas, as faltas do mundo; as dívidas que são somente o reflexo dos seus sonhos assassinados, da sua ordem abalada.
Não há de quem cobrar meu desespero, minha solidão; não há braços que decidam acolher.

Então minhas flores letrinhas, onde confio meu sono, deposito as carências. Essas delicadas criaturas, ligeiramente vivas entre sinapses coloridas.

segunda-feira, 5 de março de 2012

Poeta do século XXI

Gatinho abandonado na chuva
Falo trêmulo
Nariz em desvio

Um bandido indefeso
Âmbar de adeus

Uma bela mulher lânguida no horizonte.

O avesso de "Fernando"

O poeta é um sentidor
Sente tão completamente que chega a sentir que é dor
A dor que deveras mente.

O fim que é sempre poesia

O poeta não trabalha,
o poeta sente.
A sociedade precisa de sentidores,
seus pormenores -ou seriam pormaiores - todos?

A sociedade precisa de anjos,
os anjos são os poetas.
O poeta é meio humano e meio demasiado humano
Aquele suspenso a tratar dos silêncios.

O poeta quase não existe
É breve
A síntese do que não conseguimos dizer.
Ele diz
Traz para a carne.

O poeta é a certeza
O fundo dos nossos sonhos distorcidos
O poeta
Palavra rasa
Palavra surda
Palavra solta
Palavra nua.

Corpo estendido e nenhum improviso
Definitivo

O poeta:
A essência quando nada lhe resta.

domingo, 4 de março de 2012

Aforismas de própria autoria

Desejo não é a mesma coisa que amor; são sentimentos que podem coincidir numa mesma direção, mas é bom que se saiba que desejo é vontade de ter e amor é vontade de dar.


O problema do querer é que ele sempre implica em uma responsabilidade para com o que se quer e tudo aquilo que se insere nas condições do querer.