domingo, 25 de abril de 2010

Com tédio e um pouco de fúria

Minha vida já foi intensa. Já estive diante dos mistérios dos mundos intocados. Não sei quando ao certo deixei o paraíso e caí aqui.
Eu vivia perto das estrelas, do imenso céu escuro aonde viajava livre. Agora vivo aqui embaixo, sozinha. O mundo é um marasmo só.
Não sei, mas faz tempo que não vejo graça em nada. Tudo tão banal, tão sempre o mesmo; e os dias passando depressa.
O mundo está precisando de um metereoro – dos grandes – ou um extraterrestre.
Não sei o que aconteceu, mas acordei de um sonho de aventuras, e nada aqui tem tantas cores, é tão vibrante como antes.
Vejo o tempo passar depressa e meus colegas repetindo o passado, aquilo que eu via na minha infância: os adultos trabalhando, dirigindo seus automóveis, casando e tendo filhos, indo à praia nas férias, pagando contas. As crianças vão à escola e seus papis em algum barzinho a tomar cerveja com os amigos, que também fazem a mesma coisa, fazem a mesma vida. Não gosto disso, cada vez mais sinto que estou num lugar estranho. Sonhava que quando chegasse a fase adulta poderia transformar o mundo, que apresentaria a criação, a força, a liberdade às pessoas. Não: cheguei sozinha a esta fase da vida, meus colegas estão correndo atrás da construção de seus pequenos mundos domésticos, seus lares – doces lares -, e eu continuei aberta, desgarrada.
É isso: sou uma desgarrada. Não vou ser consumida pelo sistema, mas vou ser esquecida como alguém que nunca foi, nunca houve, nunca nasceu. Talvez alguns poucos se lembrem de mim. E quem serão esses quando lembrarem?
Não gosto de ver o mundo se repetir, parece que a vida não faz sentido se é assim. Eu envelhecendo, todos envelhecendo, mas a vida continua estática. Gente, há que se fazer uma revolução para mudar o tempo!!!
O que há é silêncio. Uma revolução sem som muda alguma coisa? O mundo hoje precisa de gritos, de rodopios, de medo, de crenças, de mistério, mortes gloriosas e salvação.
A vida hoje acontece em potes de maionese, tudo se guarda nos frascos de vidro – e nas telas da tv e dos computadores. Nada transborda, nada infecta, nada invade o espaço.
Algo ou alguém precisa invadir nossa praia.
Vamos morrer tristes assim, vamos morrer insossos. Esgotaremos as fontes de energia e morreremos como sapos em água que se aquece lentamente. Morreremos sem perceber e por isso mesmo sem termos feito nada de belo, nada de mal, nada de bom – nada de vida.
Olho em volta, não compreendo. Onde foram deixados os sonhos, as esperanças, a utopia? Auto-conhecimento, para que? Viajens subjetivas, para que? O que falta é combate, é harmonia. Tristes seres produtores de solilóquios que somos.
Atualmente se fala tanto em relação, comunicação, inter isso, inter aquilo…mas esses tão falados contatos estão ocos, não estão produzindo nada, afetando nada…Não entendo.

Civilização? Isto então que temos em sociedade é o que chamamos civilização? Este controle energético, este fluxo bem ordenado de pontinhos coloridos, todos muito bem limpinhos, modestos, funcionais e bem definidos? Quero barro, lodo, o peso do rústico sobre mim – e quem sabe daí começar alguma coisa mais vigorosa, que invada os ares, que suje a roupa, que estrague as casas, que destrua os carros, que molhe os cabelos, purifique os lábios, imponha o céu e as profundezas do mar.

Literatura Fluida

Nessa vida a gente vai se tornando e deixando de ser também. Não dá para estender o passado se quisermos entrar no futuro. Ficar é uma palavra estranha pois a permanência nunca tem sentido. O devir, contudo, cria lugares, lugares do ser, lugares onde o ser é reconhecido – morrerás sendo, tendo sido.
Espaço... O que fica nunca é o tempo, é o espaço. Que espaço quero construir? Em que espaço quero ser reconhecida? Que espaço quero ser?
Sou um espaço. O espaço está na matéria e não em seu em torno vazio. O tempo é a sua chance.
Não sei falar do som que ouço agora. Ele não é meu, mas está em mim, deu tantas voltas…Vou construindo aos pedaços minha capacidade de dizer. Não acho que tenho nada a dizer, mas sou um ponto de sintetização de espaços.