domingo, 21 de outubro de 2012

Divagações de Uma Noite Estática


Vamos ao que interessa: esta noite.

Não há vento. As árvores estão duras, plasticamente paradas.
Só há insetos pesados à minha volta. Aqueles cascudos cujo calor faz despencar do céu para a morte do amanhecer. Amanhã estarão todos mortos de pernas para cima, bamboleando sobre a casca oval.
Estou parada como o ar. Não conseguiria muitas palavras esta noite. Não conseguiria as muitas pessoas daquela praça esta noite.
Estou morna como o ar. Quieta como o vento. Atrás de minha pele tudo é morno também.
Esta noite é matéria orgânica. É dia. Os homens podem andar sem camisa nela – e o fazem.
Só penso em uma pessoa. Nesta noite morna. Não sei o que penso, vejo. Peso. Sopé.
Silêncio combina com calor ou com o frio?
Com calor tudo parece mudo, tudo parece bobo. Um assassinato: bobo. Um grito: fútil. Uma dor: inútil.  Com o frio a razão se assemelha. 

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Fala baixinho, Ana. Cochicha para essas paredes o que você não pode enunciar aqui. Elas são discretas, brancas para disfarçar o que não tem tamanho.  Eu sou branco também, um simulacro de papel; como vê. Mas eu falo alto demais, e as paredes não vagueiam como eu.
Fala para elas o que eu sei antes de você. Fala dos seus vícios, das suas brechas, da sua falsa desfaçatez. Conta de seus desejos e de suas insalubres ideias. Não liga, não. As paredes são aliadas: guardarão para sempre – mesmo depois de caídas – tudo seu que só cabe a elas.   

5 comentários:

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  3. putz enquanto lia, um desses besouros cascudos e pesados grudou na minha perna,até perdi o sono!

    No chão do meu quarto posso ver vários mortos
    amanhã serão outros tantos
    agora muitos voam
    voam e caem em torvelinhos
    e ao chão de pernas para o ar esperneiam
    farei o mesmo em poucos minutos
    a diferença que estarei vivo amanhã
    mas morrendo a cada minuto.

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  4. Estes pesados insetos, aliás, qualquer inseto nos informa do absurdo desta vida.

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